Por Alexandre Lucas*
Qual a narrativa de lugar que se pretender desenhar? Seriam as narrativas carregadas de pessimismo, imutabilidade e de destruição? É possível construir uma narrativa de lugar contrapondo-se a narrativa dominante e ao mesmo tempo redesenhar socialmente e culturalmente o lugar?
Contar e construir a história do lugar é essencial para substanciar tanto as relações de afeto, como as possiblidades de compreensão dos processos de organizações comunitários, conquistas, demandas, lutas, conflitos e desafios. As narrativas sociais dos lugares carregam sempre uma dimensão de uma determinada concepção de tipo de sociedade que se quer perpetuar ou se construir. É imprescindível definir de que lado pretender narrar a história, do lado dos oprimidos e explorados ou do lado dos que oprimem e exploram.
As narrativas não são pacíficas e imparciais, como não é a relação entre classes sociais distintas e antagônicas. Apesar disso somos bombardeados todos os dias, com ideias de que existem formas de julgar, narrar, conviver e de ciências neutras. Não convém acreditar nesta imparcialidade, ela é disposta propositalmente com o intuito de neutralizar a reação das camadas populares.
Como é narrada a história dos lugares carregados por situações de vulnerabilidade social? Predominante pelo viés da descrença, vitimismo, assistencialismo e a criminalização. Os moradores não se enxergam capazes de solucionar os seus problemas coletivos, são ensinados desde cedo pela narrativa dominante que as suas dificuldades e condições de vida serão solucionadas sempre pelos agentes externos (o empresário, o pastor/padre, o vereador, o prefeito, etc.). A população excluída das condições de qualidade de vida é ensinada a se sentir incapaz. Essa é uma das principais vertentes da narrativa de dependência para as camadas populares impostas pelas elites econômicas.
É possível se contrapor e apresentar uma narrativa de lugar que não esconda a história, não negue os seus conflitos e apresente as suas problemáticas sociais e ao mesmo tempo tenha como narradores os próprios moradores. É preciso as pessoas se sentir parte comprometida com a mudança. As pessoas querem ser percebidas, lembradas, consultadas, saírem na selfie comunitária.
É preciso recontar uma história que seja protagonizada pela esperança, pela potência criativa e pela crença de que só o povo organizado e em luta pode transformar a sua realidade. Isso tem uma relação com o combate à vulnerabilidade e a elevação da autoestima coletiva.
*Pedagogo e integrante do Coletivo Camaradas