Pesquisadores lançam nota de repúdio a projeto aprovado na Câmara Municipal do Crato


NOTA DE REPÚDIO
À COMUNIDADE ACADÊMICA E À SOCIEDADE EM GERAL

Nós que fazemos parte do LABORATÓRIO DE PESQUISA EM HISTÓRIA CULTURAL (LAPEHC) e demais professores abaixo assinados do Departamento de História da Universidade Regional do Cariri e outras instituições de ensino e pesquisa, viemos a público manifestar nossa total indignação e repúdio à aprovação, na Câmara de Vereadores do Crato, do Projeto de Lei que dispõe sobre a proibição da reflexão da temática de GÊNERO nas escolas do município.

O Projeto em questão é uma afronta aos preceitos constitucionais, portanto, INCONSTITUCIONAL, na medida em que delibera sobre tema que não compete ao município fazê-lo, conforme dispõe o Art. 22 inciso -XXVI da CONSTITUIÇÃO FEDERAL quando diz que “Compete privativamente à UNIÃO legislar sobre: (…) XXIV – diretrizes e bases da educação nacional”. Isto posto, ao se arrogar o direito de definir o que deve ou não ser debatido nas escolas do Crato o projeto infringe ainda o Art. 206 que trata da Educação, inciso III: Pluralismos de Ideias, de concepções pedagógicas. Além da CONSTITUIÇÃO FEDERAL, o projeto fere mortalmente leis Internacionais relativas aos direitos humanos de Instituições como a ONU, OMS e a própria Lei de Diretrizes e Bases do país.

Como se já não fosse uma afronta no campo jurídico, a Lei é um arrazoado constrangedor de equívocos conceituais e pedagógicos demonstrando absoluta incapacidade dos proponentes em discutir e deliberar cientificamente sobre o tema.

Alegam eles que a intenção é proibir a institucionalização de uma tal “disciplina de ideologia de gênero”, que é bom que seja ressaltado, nunca foi pensada ou cotejada em nenhum projeto educacional do país. Nesse sentido, é preciso desmascarar a elaboração perversa e mal-intencionada por trás do que grupos conservadores vêm conceituando como “ideologia de gênero”. A construção de tal noção, esta sim, é ideológica. Mas não foi retirada da produção nacional e internacional de pesquisadores acadêmicos que a décadas se dedicam de maneira séria à discussão de gênero e sua transposição para o ambiente escolar. “Ideologia de gênero” foi forjado a partir preconceitos, manipulação de informações e condutas que instigam o medo e a discriminação. Por isso mesmo,responsável pela onda denuncista e violenta que temos assistido nas escolas do país, não escapando, inclusive, professores de pós-graduação, submetidos à vil prática de grampos em sala de aula. Ações que remetem aos anos mais torpes da ditadura militar.

O Brasil é hoje um dos países que mais mata em função do não respeito às diferenças de gênero. Centenas de mulheres são espancadas, vilipendiadas e assassinadas a cada ano, tendo sido necessário a instituição de uma lei específica (Lei Maria da Penha) para tentar coibir tais violências. O que esses vereadores têm a dizer sobre os crimes de feminicídios que ocorrem na região? O que têm a dizer, também,sobre o espancamento e linchamento de jovens homossexuais em nossas cidades?

Por fim, gostaríamos de dizer que o debate simplificador, desinformado e, sobretudo, falacioso que quer criminalizar o trabalho dos professores não pode ser aceito. Tais  práticas só nos convencem da URGÊNCIA de tratarmos da temática de gênero em nossas salas de aula. Como educadores formadores de professores não nos inibiremos, sobretudo, porque compreendemos que a educação deve ser um ato de libertação contra todo e qualquer tipo de preconceito e opressão.

DEFENDEMOS: Que prefeito do CRATO, senhor Ailton Brasil, VETE IMEDIATAMENTE ESTE PROJETO, uma vez que está largamente comprovada a inconstitucionalidade da proposta.

Crato, 24 de outubro de 2017

Subscrevem:
Profa. Dra. Sônia Maria de Meneses Silva - Coordenadora do LAPEHC, Coordenadora do
Doutorado Interinstitucional em História da URCA, Bolsista Produtividade do CNPQ
Prof. Dr. Joaquim dos Santos – Chefe do Departamento, Coordenador do NHISTAL, docente do
Mestrado em Ensino de História da URCA, pesquisador sobre memória, tradição e oralidade.
Prof. Dr. Francisco Egberto de Melo - Coordenador do Núcleo de Pesquisa em Ensino de História
e Cidadania – NUPHISC, docente do Mestrado em Ensino de História da URCA
Prof. Dr. Iarê Lucas Andrade - Coordenador do PIBID de História, pesquisador de Cultura Política
Profa. Ms. Josefa Nunes - Coordenadora do PIBID de História da URCA, pesquisadora sobre
Ensino de História.
Profa. Ms. Maria Lucélia de Andrade - Doutoranda em História Social Universidade Federal do
Ceara - UFC
Profa. Ms. Carolina Maria Campos de Saboya – Advogada e Professora Universitária
Profa. Dra Rosilene Alves Melo –Antropóloga, estuda questões culturais, ensino e história
Profa. Ms. Maria Arleilma Ferreira de Sousa - Estudiosa do Campo das Religiosidades
Profa. Ms. Ana Cristina de Sales - Estudiosa do Campo das religiosidades e Memória
Profa. Ms. Maria de Fátima de Morais Pinho - Doutoranda em História pela Universidade
Federal Fluminense UFF/URCA, estuda questões sobre religiosidade.
Profa. Ms. Tereza Cândida Alvez Diniz – Estudiosa da Cultura Popular e Imagens
Profa. Ms. Jane Derarovele Semeão e Silva – Doutoranda em História pela Universidade Federal
do Rio Grande do Sul – Estuda as relações de Gênero, História e Natureza.
Prof. Ms. Victor Emmanuel Farias Nunes – Estudas as relações entre política e cultura.
Prof. Ms. Roberto Viana de Oliveira Filho - Estuda a temática das religiosidades 
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