Por Alexandre Lucas*
Só existe um discurso de uma arte
para e com o povo porque existe uma arte para e
com as elites intelectuais e
econômicas. Uma arte de pobre e uma arte
de rico, uma arte dita erudita e outra dita popular e no entremeio uma arte de
massas fabricada minuciosamente nos laboratórios do capitalismo e a serviço do
consumo, da alienação e da manutenção da ideologia do sistema burguês.
A arte com e para o povo se
caracteriza não pela delimitação estética e artística, mas pela possibilidade
de refletir sobre a condição humana dentro de um sistema segregado em classes sociais distintas e antagônicas.
Perpassa ainda pela necessidade da garantia das condições básicas de
sobrevivência e pela socialização do conhecimento produzido historicamente pela
humanidade.
Pensar uma arte com e para o povo
caminha em conceber a arte como elemento de conhecimento, instigação da criatividade,
reconhecimento do hibridismo estético, artístico e cultural e, por conseguinte
como instrumento de resistência ideológica das camadas populares.
Uma arte com e para o povo
favorece os processos de comunhão, descoberta coletiva e fraterna, garante o respeito
a individualidade e combate o individualismo disseminado e emoldurado pelo capitalismo.
Inevitavelmente, os espaços
pensados para a produção e circulação
artística e estética numa perspectiva de uma arte com e para o povo assumem passagens
que descontroem os confinamentos destinados para arte intocável das elites
econômicas e dos intelectuais ligados as
forças dominantes.
O que não significa negar os
espaços existentes, mas ampliar as relações de identidade, empoderamento e pertencimento com o povo. É preciso atentar
para outra, lógica, uma lógica de alfabetização estética e artística ligada as
camadas populares em que a população possa se enxergar dentro das várias
linguagens e pluralidades simbólicas.
A perspectiva de uma arte com e
para o povo compreende a educação formal e informal de caráter progressista e
popular, não se trata, portanto, de qualquer tipo de educação, como elemento primário
para potencializar uma arte de feição emancipatória.
O que requer a apropriação coletiva da
história, da memória, das demandas sociais e das formas de lutas, conquistas e processos
de escutas. A arte com e para o povo se alinha para reconhecer os espaços de vivência comunitária
sejam escolas, praças, terreiros, salões, balneários, etc., como lugares
privilegiados para se refletir sobre a vida e alimenta a alma de uma dimensão
humanizadora.
Uma arte com essas características
não pode ser impositiva para não estuprar a reinvenção da vida organizada
cotidianamente pelas camadas populares.
Por lado, não é possível negar,
que a sociedade que tem como cerne a apropriação privada da vida e das coisas não
gere uma arte e uma mentalidade privada em todas as suas dimensões como os espaços destinados às artes, a circulação, produção e
fruição artística e estética.
Neste sentido, essa perspectiva
privada da arte entra inevitavelmente em conflito com uma perspectiva que tenha
como embrião a democratização do saber e da descoberta coletiva que focalize para a “descoisificação” da vida.
A arte com e para o povo não é “menoritária” apenas se
negar a atender aos deleites de uma arte monetária, fracionária, reacionária e sanguinária.
Portanto dentro do capitalismo a
arte com e para o povo é uma arte de guerrilha que criar focos de resistência e
de construção de uma nova perspectiva de sociedade em que impere as formas mais
fraternas de humanização e de compartilhamento da vida e reconheça apenas um
tipo de propriedade: A coletivizada.
Somente numa sociedade que tenha como
norte a coletividade é que poderemos ter uma arte e uma mentalidade
coletivizada que respeite a diversidade e a pluralidade estética e artística
como fator de desenvolvimento humano.
Porém, enquanto os donos do poder
e seus aliados, incluindo intelectuais e artistas alinhados as suas ideias,
insistirem em fazerem uma arte dentro do
ovo. Existirá um povo fazendo arte do lado de fora e quebrando todos os ovos
para que a arte se liberte das redomas capitalistas.
*Pedagogo, artista/educador e
Coordenador do Coletivo Camaradas.