Por Felipe Silva Ferreira*
A
biodiversidade é uma fonte inestimável de informação e matéria-prima que
suporta vários sistemas médico-tradicionais ao redor do mundo. A importância da
natureza como fonte de medicamentos é demonstrada pelo elevado número de
plantas e animais que fornecem vários produtos para o tratamento de diversas
doenças que acometem humanos (Ferreira, 2013; Alves et al., 2013). Embora plantas constituam a maioria dos
ingredientes usados nos sistemas médicos tradicionais, animais (inteiros e
produtos derivados) também representam importantes elementos da medicina
tradicional em todo o mundo. O tratamento de doenças humanas e de outros animais usando
produtos derivados da fauna é conhecido como Zooterapia, que segundo Marques (1994), consiste em uma prática
supostamente presente em todas as culturas humanas (“hipótese da universalidade
zooterápica”).
O Brasil, que pela
riqueza de sua biodiversidade é conhecido como um país megadiverso (Alves,
2009), possui também
uma rica sociodiversidade representada por mais de 200 povos indígenas, uma
diversidade de comunidades locais (quilombolas, caiçaras, seringueiros, etc.)
que reúnem um amplo conhecimento sobre o uso tradicional da biodiversidade.
Atualmente, sabe-se que, pelo menos, 354
espécies são usadas para propósitos medicinais no Brasil (Alves et al, 2013).
Esse número está certamente subestimado, visto que a quantidade de estudos no
tema é muito limitada e se concentra principalmente em algumas localidades.
Dessa forma, foi conduzido um estudo sobre o uso de animais pra fins medicinais
nas cidades de Crato e Juazeiro do Norte, objetivando listar quais são os
animais utilizadados para o tratamento de doenças por moradores dessas duas
localidades e quais são as doenças tratadas por esses produtos.
Considerando a importania biológica e cultural da região do cariri
cearense, o uso medicinal se mostrou uma prática comum. Nessas cidades, um total de 41
espécies, distribuídas em 32 famílias foi relatado por apresentarem alguma
aplicação medicinal. Essas espécies são utilizadas no tratamento de 39 doenças
e sintomas. As categorias taxonômicas mais representativas foram: insetos (11),
mamíferos (11), répteis (6), peixes (5) e aves (5). Esses resultados sobre o
uso de animais para fins medicinais no estado do Ceará corroboram outros estudos
que mostram o uso de zooterápicos como uma atividade comum em diversas cidades
do semi-árido Nordestino (Ferreira, 2013; Alves et al., 2013). Esses dados
reforçam a importância de estudos etnozoológicos como ferramenta para o
desenvolvimento de políticas que propiciem um uso racional e sustentável da
biodiversidade. Dessa forma, o
conhecimento sobre o uso de animais apresenta importância social, biológica e
farmacológica para a região do Cariri.
Diante do exposto, uma
considerável atenção vem sendo dada os recursos naturais do Brasil e do mundo
e, por conseguinte estudos etnobiológicos contribuem fornecendo subsídios para
o seu uso e manejo. Esses resultados mostram a importância de estudos abrangentes que enfoquem os aspectos sociais, culturais,
econômicos, clínicos e ambientais objetivando uma maior compreensão sobre os
animais medicinais, visando o estabelecimento de medidas de manejo adequadas
que possibilitem a sustentabilidade dos recursos zooterápicos.
*Doutor em Zoologia pela Universidade Federal da Paraíba
Referencias Bibliográficas
Alves, R. R. N., I. L. Rosa, U. P. Albuquerque & A. B.
Cunningham. 2013. Medicine from the Wild: An Overview of the Use
and Trade of Animal Products in Traditional Medicines. In Animals in Traditional Folk Medicine, eds. R. R. N. Alves & I.
Rosa, 25-42. Springer.