Dia desses, passei em frente a uma casa de espetáculos, ali no Centro do Rio de Janeiro e mirei a tabela de preço do admirável estabelecimento. “R$ 250”, dizia o anúncio voltado para a rua, a quem quisesse parar para lê-lo.
Não era preciso fazer o cálculo mentalmente pra chegar à conclusão de que o valor se equipara a um terço do salário mínimo do trabalhador brasileiro. Apesar do valor alto, que segrega um público sedento por arte e cultura na capital carioca, a realidade sobre os valores monstruosos de espetáculos de teatro, dança e cinema estão por todos os cantos da indústria cultural do País. E uma das grandes razões é: a aplicação anárquica e não criteriosa da meia-entrada, junto da proliferação de carteiras estudantis não padronizadas no Brasil.
Há mais de uma década, o Congresso Brasileiro se vê em meio ao debate sobre a legislação nacional das carteirinhas de estudante. Entre uma audiência e outra, quase sempre era impossível estabelecer um acordo legal para contemplar artistas, estudantes, produtores e sociedade civil. Por conta dessa falta de acordo, o amparo legal nacional sobre o direito à meia-entrada se resguardava nas regionalidades, através de leis formuladas e aprovadas nos estados sobre suas próprias cotas. Em alguns estados, por exemplo, apenas 10% dos ingressos podem ser reservados para a “meia”, como é o caso de São Paulo.Observando esses contrastes, vejo que o Brasil clama por uma legislação forte sobre o tema.
É o caso do Projeto de Lei (PL) 4.571, apresentado em 2008, e que se encontra atualmente na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. É lá que, artistas, associações de produtores de teatro e cinema, assim como entidades nacionais de estudantes, lutam para uma aprovação ágil e segura. Esta semana foi definitivamente um embate pela aprovação da matéria naquele colegiado, unindo todas as entidades em um só objetivo. Isso porque a própria matéria, que especifica as diretrizes básicas para a meia-entrada no País, é um marco histórico para a nossa realidade. É o benefício que estudantes e idosos poderão desfrutar com segurança e tranquilidade.
Eu mesma, na função de relatora do projeto dentro da Comissão de Educação, antes de chegar à CCJ, percebi que seu texto final, construído durante cinco anos e que superou contradições entre produtores, artistas e entidades de juventude, exercerá um poder emancipador às famílias brasileiras então excluídas do eixo cultural de seus centros urbanos. Ao estabelecer a cota de 40% na bilheteria para ingressos de meia-entrada no País, a futura lei permitirá que o próprio valor ‘natural’ dos ingressos recue até 30%, de acordo com estudos da Associação dos Produtores Teatrais Independentes do Estado de São Paulo, criando, assim, uma margem maior de compra para os consumidores que não se beneficiam da meia-entrada (no caso idosos e estudantes).
Mas não é apenas a redução gradual do valor dos ingressos que a lei dará sequência assim que passar pela Câmara e Senado. O cadastro nacional das carteiras de estudantes, por exemplo, hoje tidas como 80% do consumo dos ingressos de uma casa de shows, será um trabalho de entidades nacionais com referência e credibilidade no assunto, a exemplo da União Nacional dos Estudantes, União Brasileira dos Estudantes e Associação Nacional dos Pós-Graduandos.
Sua distribuição será feita por diversos pontos no País, como centros universitários, por exemplo, facilitando a chegada do benefício aos estudantes. Ao definir as entidades emissoras e criar estrutura nacional reconhecida, a nova lei da meia-entrada ataca diretamente a livre máfia que produz carteiras de estudantes piratas. Por isso que, sem uma lei específica, não são os próprios estudantes penalizados indiretamente, mas todo consumidor de cultura do Brasil. Neste sentido, é necessário que a CCJ vote e aprove urgentemente o PL 4.571, sem ceder às pressões de entidades paralelas, não representativas ou dos defensores de uma falsa universalidade.
* Foi deputada estadual, quatro vezes deputada federal, secretária de Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia de Niterói e Secretária municipal de Cultura do Rio de Janei