Cicera Nunes
Profa. do Departamento de Educação da URCA
A
educação brasileira sempre desconsiderou a história dos negros e afrodescendentes,
mascarando os indicadores que atestam as desigualdades históricas entre negros e
brancos. Os grupos dominantes brasileiros encarregaram-se de disseminar a
discriminação com as populações negras e mestiças, proibindo as religiões de
origem africana, perseguindo os mestres que tentavam ensinar a capoeira, dentre
outras perseguições às manifestações culturais do povo negro. O negro sempre
foi tido como o outro, inatamente inferior. Fato notadamente presente nas produções dos pensadores da elite brasileira durante
os séculos XIX e XX que se utilizavam de suas teorias para negar a forte presença
do negro na sociedade brasileira ou tratá-lo como intelectualmente incapaz. Por
outro lado, estudos e pesquisas demonstram que as desigualdades entre negros e
brancos persistem após cem anos do fim da escravatura o que
demonstra o descaso dos nossos governantes e a falta de comprometimento com
ações que revertam essa situação. Os preconceitos que resultaram desse processo
tem dificultado o conhecimento da diversidade africana. Existe uma lacuna muito
grande em torno de conhecimentos sobre os diversos povos que vieram para o
Brasil e as riquezas de cada região, gerando uma visão distorcida de que na
África todos tinham os mesmos hábitos e tradições. O desconhecimento da
história e cultura africana tem contribuído para a idéia de que o continente
africano era habitado por tribos primitivas, por homens e mulheres “incultos(as)”. Idéia esta disseminada pelos colonizadores europeus na tentativa de justificar o processo de colonização. O
conhecimento que se tem da África não leva em consideração as suas produções
intelectuais e tecnológicas. O escravismo criminoso promoveu a destruição de
séculos de cultura e civilização. Daí a importância de conhecermos profundamente a organização das
sociedades africanas anterior à colonização para que possamos compreender as
dinâmicas internas dessas sociedades, percebendo as características singulares
desse continente, bem como a sua diversidade e complexidade. Diante
desse quadro, coloca-se a necessidade de um estudo aprofundado e pesquisas
nessa área que mostrem como eram constituídas as sociedades africanas antes da
colonização, atentando para os aspectos históricos, culturais, religiosos,
artísticos, tecnológicos. A formação social
brasileira foi diretamente influenciada pela singularidade da cultura africana
o que demonstra a resistência desses povos ao processo de dominação européia. Os
valores e princípios negro-africanos foram trazidos na escravidão. Aqui,
fugindo dos seus senhores, usavam atitudes criativas para se manterem fiéis aos
seus valores, preservando mitos e ritos de suas tradições. A desconstrução
desse imaginário racista, resultante dos processos de dominação eurocêntrica,
constitui tarefa das instituições de ensino. A escola tem a responsabilidade de
construir significações positivas da cultura africana e afrodescendente e
desenvolver ações que promovam o respeito à diversidade cultural e histórica. Defendemos que a educação
escolar que é oferecida às crianças e jovens no Cariri cearense não pode ficar
alheia aos fatos históricos e culturais que envolvem o povo africano e
afrodescendente. Os professores precisam compreender as particularidades de uma
história que vem sendo criada, recriada e ressignificada ao longo do tempo,
para que possam promover um redimensionamento na sua forma de educar que parta
dos contextos socioculturais em que os indivíduos se encontram inseridos,
possibilitando que as diferenças sejam reconhecidas e respeitadas.